Um dos primeiros passos para criar um projeto de sucesso é reunirmos toda a informação que o cliente nos dá e criar um concept board de inspirações, onde reunimos texturas, cores e elementos chave para completar todo o ambiente. Este documento visual não é apenas uma ferramenta de apresentação — é o alicerce conceptual sobre o qual todo o trabalho se constrói, o momento em que ideias abstractas começam a ganhar materialidade tangível.

Mais Que Uma Colagem: Um Manifesto Visual

Existe um equívoco comum sobre os concept boards: muitos veem-nos como simples colagens decorativas, agradáveis aos olhos mas superficiais no conteúdo. A realidade é radicalmente diferente. Um concept board profissional é um instrumento de comunicação sofisticado que traduz conversas, aspirações e necessidades em linguagem visual coerente.

Quando me sento com um cliente pela primeira vez, ouço muito mais do que preferências estéticas. Ouço histórias de vida, rotinas quotidianas, memórias emocionais ligadas a espaços anteriores, frustrações com soluções que não funcionaram. Toda esta informação — muitas vezes fragmentada, por vezes contraditória — precisa de ser destilada numa visão clara. É exactamente isto que o concept board faz no design de interiores: transforma narrativa verbal em proposta visual concreta.

O Processo de Curadoria

Criar um concept board eficaz exige curadoria rigorosa. Não se trata de juntar imagens bonitas aleatoriamente, mas de seleccionar cada elemento com propósito específico. Começo sempre por identificar as palavras-chave que emergiram durante as conversas iniciais. “Acolhedor”, “luminoso”, “sofisticado mas descontraído”, “conectado com a natureza” — cada termo orienta a selecção visual.

As texturas ocupam lugar central neste processo. Não basta mostrar uma fotografia de madeira — é preciso comunicar que tipo, com que acabamento, evocando que atmosfera. Incluo sempre amostras físicas sempre que possível: os muitos  catálogos  de tecidos, uma amostra e a amostra de madeira a usar. A dimensão táctil é insubstituível quando projectamos ambientes que serão vividos diariamente.

A paleta cromática define-se progressivamente. Começo com tons amplos e vou refinando. Talvez o cliente tenha dito que adora azul, mas existem centenas de azuis possíveis. Através do concept board, apresento a minha interpretação: um azul-petróleo profundo que confere sofisticação, ou um azul-cinza suave que transmite serenidade? As nuances importam profundamente, e o board permite explorar essas subtilezas antes de qualquer compromisso.

Elementos Chave: Definir a Identidade do Espaço

Cada concept board inclui aquilo a que chamo “elementos âncora” — peças ou materiais que definem a identidade do ambiente. Pode ser um movel de grandes dimensões em madeira de eucalipto que divide os espaços . Pode ser um tecido excepcional em fibras recicladas que comunica tanto sofisticação quanto consciência ambiental. Pode ser uma pedra natural com veios dramáticos que se tornará protagonista visual.

Estes elementos não são escolhidos arbitrariamente. Resultam de compreensão profunda sobre o que o espaço precisa de comunicar. Se estamos a trabalhar num apartamento contemporâneo com vista para o Douro, talvez os elementos âncora privilegiem transparências, reflexos, materiais que dialoguem com a água e a luz. Se o projecto envolve uma casa de família com história, talvez os componentes centrais conectem passado e presente através de materiais atemporais com carácter.

O mobiliário aparece frequentemente no concept board, não como lista de compras, mas como expressão de proporções e estilo. Uma poltrona específica pode estar incluída não necessariamente porque será aquela exactamente, mas porque comunica a linguagem formal que pretendemos — linhas orgânicas versus geometria rigorosa, volumes generosos versus elegância contida.

Design de interiores - Concept Board é Onde a Visão Começa a Ganhar Forma
Design de interiores – Concept Board é Onde a Visão Começa a Ganhar Forma

A Coerência Como Princípio

Um concept board verdadeiramente eficaz não apresenta mil direcções possíveis — apresenta uma visão coerente com variações subtis. Quando o olho percorre o board, deve sentir continuidade, diálogo entre elementos, harmonia compositiva. Isto não significa monotonia; significa que existe um fio condutor inteligível ligando cada escolha.

Trabalho frequentemente com a regra do 60-30-10 mesmo nesta fase inicial: 60% do board reflecte a atmosfera dominante, 30% introduz elementos complementares que enriquecem, e 10% traz toques de contraste ou surpresa que conferem personalidade. Esta estrutura garante equilíbrio visual e previne confusão.

A iluminação, embora mais difícil de representar estaticamente, também precisa de estar presente. Incluo referências de como a luz natural será celebrada ou controlada, que tipo de iluminação artificial criará atmosferas específicas. Por vezes, uma simples imagem de luz filtrada através de linho translúcido comunica mais sobre as intenções do projecto do que páginas de texto explicativo.

Ferramenta de Validação e Alinhamento

O momento de apresentação do concept board é crucial no desenvolvimento de qualquer ambiente. É quando verificamos se a minha interpretação das conversas iniciais alinham com as expectativas do cliente. Esta validação precoce poupa tempo, dinheiro e desgaste emocional. Se houver desalinhamento — se o cliente imaginava algo mais ousado, ou mais contido, ou cromáticamente diferente — descobrimos agora, quando ajustar é simples.

Curiosamente, muitos clientes não sabem exactamente o que querem até verem o que não querem. O concept board funciona como catalisador dessa clarificação. Ao observarem a proposta visual, conseguem finalmente articular: “Sim, é isto, mas com madeiras mais claras” ou “Gosto da direcção, mas sinto que precisa de mais textura”. Estas nuances, difíceis de expressar abstractamente, tornam-se evidentes quando confrontadas com propostas concretas.

Trabalhar com este método no design de interiores traz segurança tanto ao profissional quanto ao cliente. Avançamos juntos com confiança, sabendo que partilhamos a mesma visão para o espaço que estamos a criar.

Do Conceito à Execução

O concept board não é documento estático que se engaveta após aprovação. Permanece vivo durante todo o desenvolvimento, funcionando como referência constante. Quando surgem dúvidas durante a execução — e surgem sempre — voltamos ao board. Aquela almofada proposta está alinhada com a visão original? Aquele candeeiro alternativo respeita a atmosfera definida?

Esta função de norte conceptual é especialmente valiosa em obras que se desenvolvem durante meses. A memória é falível; as prioridades aparentes alteram-se; surgem tentações de seguir tangentes que comprometem coerência. O concept board funciona como guardião da visão inicial, lembrando-nos constantemente daquilo que pretendíamos alcançar.

A Base de Tudo

Ao longo da minha carreira profissional, aprendi que projectos de design de interiores que começam com concept boards sólidos invariavelmente transcorrem mais fluidamente do que aqueles que saltam esta etapa. A clareza inicial gera confiança mútua, estabelece parâmetros claros para decisões subsequentes, e cria uma linguagem visual partilhada que facilita toda a comunicação futura.

O concept board é, essencialmente, o momento onde a magia começa. Onde conversas se transformam em texturas, aspirações em paletas cromáticas, sonhos em elementos tangíveis que lentamente se organizarão num espaço coerente, harmonioso e profundamente pessoal. É o primeiro passo — mas talvez o mais importante — na jornada de transformar uma casa vazia em lar repleto de significado e identidade única.

Conceição Lopes – Atelier de Design de Interiores e Projetos 3D | Porto